sábado, 9 de julho de 2011

Stress em Canberra

Mas menina, não é que em todo canto que eu chego aqui em Sydney, o povo fala mal de Canberra?
Pois é. Quando eu dizia que tinha stress in Canberra, eu acho que o povo pensava que eu era louca. Como alguém poderia pensar em se estressar numa cidade morta como aquela? Agora, aqui em Sydney, todo mundo me entende.

É assim mesmo. Hoje eu encontrei uma nova amiga que mora no condomínio, e conversei muito com ela. Ela ficou abismada de saber como é que eu tinha saído do Brasil para morar em Canberra! Ao saber que eu sou brasileira, ela ficou muito contente e disse que tinha amigos brasileiros de quem ela gostava muito, de São Paulo.



Razão do meu stress em Canberra. Você está vendo alguma coisa? Justamente por isso! Lá estão os bairros onde eu morava, no pé deste morro Tuggeranong.
A mesma coisa aconteceu no correio hoje. Chegando lá, quando a dona me viu, fez o maior alarde. Ela gosta muito de mim, já conversamos um bocado antes, e quando eu disse que tinha vindo do médico, ela perguntou: Está doente? Eu disse, não, é só stress. Então ela disse, “minha filha, você está em Sydney, aqui não existe stress, Canberra ficou para trás,” e rimos muito, tudo isso bem alto, e todo mundo ouvindo. Ela sabe que tive muito stress quando vivia em Canberra.
Quer dizer, aonde eu vou, que o povo sabe que eu vim de Canberra, diz, “meu Deus, onde você esteve vivendo este tempo todo”, 12 anos naquele fim de mundo.

Bem, tudo isso é muito complicado de entender, mas vou tentar explicar.

Nos primeiros anos, Canberra parecia o paraíso. Meu marido costumava dizer que era o lugar ideal para criar crianças. Hoje, meu filho com 19 anos diz a mesma coisa. 


Maravilhosa Canberra
Mas com o tempo fomos descobrindo o que significa viver em Canberra. Tem muitos problemas para quem é brasileiro, e mulher, como no meu caso. Pior ainda, mulher acima dos 40, estrangeira, sem conhecimento da língua.

Então me dediquei à casa e às criancas ainda pequenas e só comecei a estudar a língua de verdade quando eles já estavam bem adaptados, pois antes eu só ia duas vezes por semana ao centro comunitário para uma hora de aula de Inglês.


Centro de Tuggeranong visto do lago, com o centro comunitário no meio e o "college" dos meninos (secundário) à direita
E uma história puxa outra. Depois de tê-los criado, e pelo sucesso que tive (e meu marido também), descobri que adoro crianças, e que gostaria muito de mudar de ramo para lidar com elas. Ah, minha querida, tive que desistir! Ser mãe na Austrália não vale uma titica de galinha.

Por sinal, quando as pessoas sabem que tenho dois filhos na universidade aqui em Sydney, elas me parabenizam dizendo que sou uma excelente mãe, que eu fiz um bom trabalho (frase que eles adoram, “good work”!) porque a maioria dos jovens daqui não querem nada com a vida e se contentam com empreguinhos de servir nas Mac Donalds da vida.

Depois eu conto sobre a minha saga maternal e o problema seríssimo das crianças australianas.

Voltando a Canberra, para mim acabou ficando estressante pela falta de pessoas “normais” para conviver, como estou achando aqui em Sydney, e como tenho tantas pessoas assim no Brasil. 

Uma das atrações era poder "pisar" no governo, mas agora não é mais permitido subir neste gramado do palácio do governo (novo parlamento) aí por causa do terrorismo, claro.
Meu marido é bem diferente. Ele sempre teve a turma dele no trabalho, conversa o dia inteiro. Eu não tinha ninguém para conversar. Ele trabalha o dia inteiro, e eu, apesar de sair todo dia, quando as crianças cresceram, passei a não conseguir preencher meu tempo em Canberra. E olha que eu tentei um monte de coisas. Como diz meu marido, Canberra não é uma cidade para mulheres, o que soa meio sociopático, quando a gente vê elas em todo canto se mostrando como as donas do pedaço. Enfim, uma das particularidades do Canberrano é ser bastante hipócrita.
Depois de dois anos viajando por aqui, e por ali, depois de termos conhecido muitas partes da Austrália, acabamos enchendo o saco, pois todos os lugares, de repente, parecem iguais e sem atrações. Todas as cidadezinhas do interior são iguais, e o povo acaba curtindo os resorts, mas resort não é algo de que gostamos, com suas atrações programadas e belezas artificiais, além de custarem caro, claro.

Meu stress era justamente por me irritar muito com a babaquice do povo de Canberra, pessoas insuportáveis, casas vazias, ruas vazias, imensidão de mato, falta de calçadas, ônibus que duram uma vida, muito espaço pra pouca vida.



Caminho de casa, muito espaço, ninguém à vista, nem mesmo se enxerga os bairros de cada lado desta avenida
Cheguei a ter uma úlcera em Canberra. Viajei para o Brasil ulcerada, magra, acabada. Consegui me curar, mas até hoje morro de medo de abrir outra úlcera. Pelo menos aqui em Sydney, não parece que vou ter outra úlcera. Meu stress atual se deve a outros problemas pelos quais estamos passando, ainda por causa de nossa mudança de Canberra para Sydney. Coisas a serem terminadas e tal. Este é o meu stress, mas não posso sair por aí dizendo pra todo mundo do que se trata. Eu chamo de “o efeito Canberra”.


Parada de ônibus. Passa ônibus aí, tem certeza?
Meu marido gosta de Canberra. Uma cidade feita para carros, e ele adora dirigir. Do mesmo jeito ele adora vir todo fim de semana para Sydney dirigindo por 600 km ida e volta numa estrada onde não acontece nada, não se cruza uma só cidade (todas ficam fora da auto-estrada), só ouvindo música. A atração é, de hora em hora, olha, uma Mac Donalds! Ah, e o ponto turístico é o Lago George, uma imensidão totalmente vazia, que nem água tem. É o maior lago raso do mundo, ou seja, uma imensa campina com absolutamente nada. E o povo ainda pára para olhar nos mirantes!
Lago George, quando ainda tinha uma nesguinha de água por perto, hoje só aquela lá longe, mas está enchendo de novo
Para ele basta ir ao shopping uma ou duas vezes por semana (comigo, claro) para fazer compras de super-mercado. E o resto do tempo é no computador.

Mas eu não me entretenho com computadores. Em Canberra eu fiz limpeza de casa de amigos brasileiros, australianos, indianos, chineses, ganhando razoavelmente, mas então não falava com ninguém naquele tipo de trabalho, estava todo mundo trabalhando e não tinha ninguém em casa. E o esforço acabou sendo muito grande para a minha idade.
Subúrbio típico de Canberra
Minhas amigas moravam longe, sempre longe, pois tudo é longe em Canberra, uma cidade absurdamente espalhada, onde não existem edifícios, e tudo são casas grandes com imensos quintais. Como se não bastasse, cada grupo de poucos bairros é separado dos outros por reservas florestais, montanhas, ou parques ecológicos. Mato demais, de dar nos nervos. E eu não dirijo, por convicção. Depois de fazer bilu-bilu nos cangurus por dois anos, até eles perderam a graça, e o que mais a gente vê são cangurus mortos atropelados (argh!).

Além disso, não se vê os bairros quando se trafega em Canberra. Quando chegamos aqui e fomos apanhados no aeroporto para o apart-hotel, ficamos nos perguntando, cadê a cidade? Quando meu marido chegou em Tuggeranong, onde o escritório em que ele ia trabalhar ficava, ele perguntou-se a si próprio, cadê a cidade? Isso aqui são escritórios? Um punhado de predinhos num centrinho, com um shoppinho no meio. Tudo vazio com ruas espaçosas, sem trânsito, sem pessoas na rua, sem nada. Tudo muito ordeiro, muito chique, mas muito vazio.
Cadê a cidade?
O truque é que as estradas são fora dos bairros para protegerem eles do tráfego, então você vai direto pra sua casa nos cafundés do Judas pela tal estrada sem ver uma casa sequer, a não ser nos morros. Quando chega no seu bairro, você “entra” nele por uma ou, no máximo, duas entradas únicas e fica rodando lá por dentro até achar sua casa. 

“Rodando” porque as ruas são curvas, então este “estilo” maravilhoso do início do século 20 quando a cidade foi criada, deixa você tonto e totalmente desnorteado. A idéia é que ruas curvas são mais “belas”, mas você perde totalmente seu senso de orientação por causa disso. 
Ruas curvas pra você se desorientar e muito mato
Mas é batata. Todo mundo aqui em Sydney fala mal de Canberra. Aproveitam pra descer o sarrafo quando chego reclamando dos 12 anos que perdi internada naquele sanatório.

É difícil pra meu marido entender isso, mas pelo menos eu consegui fazê-lo mover-se e mudar-se para Sydney, se bem que um pedaço dele ficou lá em Canberra até ele conseguir um emprego aqui. Emprego não está fácil.

Canberra com “N”

Curiosidade: é Canberra com “n” mesmo, antes do “b”. É porque é uma palavra aborígine que significa ponto de encontro. Canberra é uma cidade planejada como Brasília, mas como Brasília herdou um estilo posterior, da década de 50, quando o estilo de Canberra é da década de 10, então Brasília é quadrada, enquanto Canberra é redonda.

Canberra tem muitas particularidades estranhas, como por exemplo, mal tem um ou dois prédios altos, e é extremamente espalhada, de um jeito que quem vê fotos aéreas sempre pergunta, cadê a cidade? Além disso é escura de noite, tremendamente escura, tétrica, mas o povo gosta disso!

Canberra só tem 300.000 habitantes, mas é maior do que Recife em área. Imagine Recife sem prédio nenhum, sem aquela selva de pedra! Imagine cruzar de Candeias até Maria Farinha pra ir de casa pro trabalho numa auto-estrada cercada de matas dos dois lados e sem praia, claro, sem sair da cidade levando 20 a 40 minutos. Pronto, isso é Canberra. Imagine uma cidade sem bancas de revistas nem barraquinhas de côco, ou sorveterias nas ruas. Imagine uma pessoa por quilômetro quadrado caminhando ou passeando bem ligeiro com o cachorro ou andando de bicicleta toda coberta com aquelas roupas colantes coloridas e de capacete (ou seja, você jamais vai adivinhar quem é). Imagine parar num sinal de trânsito cheio de carros ao redor e ninguém olhar pra sua cara.

Outra vista de subúrbio típico de Canberra
Imagine você parar no meio do nada, no pé de uma reserva florestal, e desaparecer dentro dela para caminhar, deixando o carro estacionado do lado de fora, sozinho. Este é um dos programas do morador de Canberra. E eles adoram o que eu chamo de programa de índio! Depois não sabem porque se suicidam de depressão. É o amor à natureza!

Canberra foi boa para as crianças. Podíamos passear em parques sem perigos, estacionar de vidros abertos, mas quando chegamos aqui, as pessoas nos diziam que já não era mais possível sair de casa e deixar a porta só encostada como anos antes. Veja só, tem brasileiro que bota no blog que em Sydney se pode sair sem fechar a porta. Não acredite. Não se pode fazer isso nem em Canberra, quanto mais em Sydney.

Canberra ainda é uma cidade muito segura, com um trânsito quase maravilhoso, mas acaba tudo se tornando absurdamente entediante e chata. Muita organização, ninguém consegue ser humano desse jeito. Por baixo desta capa, existe uma Canberra muito corrupta, com famílias altamente desregradas, misturadas, separadas, drogadas, cheias de taras, etc e tal. Tudo em nome da privacidade, e as pessoas fazendo o que não devem dentro de suas paredes de ouro, cercadas de tecnologia.

Sydney é muito mais humana. Cheia de defeitinhos, justamente aquilo que mais amamos, a “normalidade” orgânica, não planejada, e realmente até caótica!

4 comentários:

  1. Pena você não saber ingles, e pelo que percebi também não tem Universidade,poderia ter feito uma pós em Canberra, tem algumas ótimas. Tena sua vida vazia não comportar o amor pela natureza. Boa sorte em Sydney, estude e sua perspectiva vai ser melhor.

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    1. Querida Inez, me perdoe, mas você é uma cretina. Eu não só sou formada, como pós graduada também e trabalhei 17 anos no Brasil em grandes empresas, bancos e até no serviço público. Acontece que não quis mais trabalhar na minha área na Austrália porque decidi criar os meus filhos e gostei tanto de criá-los que preferi tentar trabalhar com crianças. Eles se sairam tão bem na vida que não posso nem falar aqui porque pessoas como você estourariam pelas costas de inveja. Nem sequer me dei ao trabalho de traduzir meus diplomas ou obter reconhecimento do conselho profissional australiano, querida. Infelizmente trabalhar com crianças mostrou-se impossível neste país por diversas razões que dá pra imaginar lendo meu blog. Não é como no Brasil, crianças aqui são propriedades, não pequenos seres humanos. Por outro lado, minha querida, gosto muito de dizer que não falo Inglês, mas isso não é bem verdade, é mais para me desculpar e calar a boca dos outros imediatamente ou obrigá-los a falarem direito. Eu não falo como uma repórter de TV, mas costumo resolver todos os problemas sozinha pois não vivo dentro de casa. Para o seu governo, no início também fiz alguns cursos aqui neste país, mas sinceramente, eles devem ser bons pra você, mas não para mim. Não queira nem saber como foram as universidades de nossos filhos aqui, completamente fora do conceito de universidade que temos no Brasil. E foi das melhores universidades australianas! Elas só são boas pra você mesmo. Ah, pra seu governo eu me criei nas praias do Brasil, me embrenhei nas matas da da Floresta da Tijuca, estive em Foz do Iguaçu, ou você acha que isto não é natureza? Agora, cobras, lagartos e aranhas venenosos do deserto australiano, isso eu deixo pra você. Aproveite para dar uma olhadinha no comentário de Kátia Santos no post "Diversão dos Jovens Australianos", e aprender a escrever. Apesar da sua mensagem idiota, obrigada mesmo assim por tê-la deixado aqui.

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  2. KKKKKKKKKKK estou achando isso engraçado. Mas tem criminalidade em Canberra? O povo se droga?

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    1. Oi Henrique, obrigado por comentar. Fazem 7 anos que não piso em Canberra mas acompanho tudo o que acontece na Austrália inteira diariamente através de vários programas em várias TVs abertas. Além de ter presenciado drogados na vizinhança lá em Canberra por 8 anos só de um mesmo endereço, tenho visto raids da Polícia invadindo casas, prendendo gangues e descobrindo plantações de maconha hidropônica cultivadas em casas chiques alugadas ou compradas só para isso. Apesar de que usar maconha não é mais crime, mas produzir como droga ainda é. A droga está invadindo cada vez mais a Austrália. Ontem mesmo policiais entraram num ônibus em Sydney, num local bastante movimentado a chamado do motorista, profissão que sofre diversos ataques como este, e teve que usar taser num passageiro que estava drogado perturbando todo mundo. Está em todos os jornais australianos online, se quiser comprovar. Aproveite para comprovar o que é divulgado diariamente, como mães drogadas ou bêbadas dirigindo e causando acidentes, até com bebês no carro, como aconteceu esta semana também. A gente fala do brasileiro que não sabe reconhecer o paraíso em que vive, mas os australianos são muito piores porque aqui nem sequer tem pobres pra se drogarem ou se criminalizarem, um motivo famoso no Brasil. É da índole mesmo, da falta de caráter, da falta de valores espirituais e morais, da falta de educação. Os problemas da Austrália são imensos com relação aos seres humanos, você não pode calcular de longe e nem ter uma noção enquanto dá uma de turista. Estas coisas só são notadas por quem vive muitos anos neste país, e sabemos que em outros países anglos a coisa é ainda mais séria, como Inglaterra, Estados Unidos e Canadá.

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