sábado, 15 de março de 2014

Maratona Balouçante

A minha maratona de hoje merece um post.

Lá vou eu toda faceira para a casa de uma amiga numa bela e quente tarde de quarta-feira, de ônibus como sempre faço periodicamente, sem ter a menor noção da aventura que se me acercava. Esta amiga mora no centro de Sydney, e eu vinha de um subúrbio a apenas 10 quilômetros de distância em direção sudoeste.

O trânsito estava particularmente caótico porque tinha havido acidentes em várias partes da cidade, mas o que me aguardava pela frente simplesmente não “estava no gibi”.


George Street, Sydney
O ônibus parou e não andou mais por mais de 1 hora. Sim, literalmente parou, e não se mexia mais. Com o tempo as pessoas foram descendo, e eu fui ficando pois ainda estava muito longe do meu destino. O trânsito ali na localidade chamada Broadway estava impossível. Eu já tinha visto na news da televisão antes de sair que tinha havido também um incêndio numa obra lá no centro, num local chamado Barangaroo ("burangarú", mistura de baranga com canguru), e que por conta disso, as bases de um daqueles imensos guindastes de construção, como os dois que caíram recentemente e se esborracharam no chão, estavam arriscadas de ruir também. Quer dizer, uma das coisas comuns que acontecem em Sydney é levar um guindaste gigante na cabeça.


Bem, este guindaste não caiu exatamente na cabeça do povo em novembro passado...
E nada de o tráfego fluir, nada dos carros andarem, nada do ônibus sair do lugar. Ele foi se arrastando até mais adiante, parando na frente de uma enorme parada de ônibus que eu chamo de “telhado de vidro” (Central Square), quando o motorista então disse, “quem vai para o centro, por favor, pegue o trem porque não tem a menor condição nem de carro nem de ônibus sairem daqui”. “Mas meu senhor, o que aconteceu?” “E eu sei?” Ora, como é que os motoristas de hoje, cercados de câmeras pra todo lado, cheios de telefones celulares, circuitos de TV, o escambau, ainda assim não são informados sobre o que está acontecendo, minha gente? Ou seria de propósito? Afinal, se fosse um ataque terrorista, “eles” não iam querer que o povo entrasse em pânico, não é? Uma boa desculpa.


O telhado de vidro
Ai meu Deus, e agora? Eu nunca andei de trem aqui em Sydney e nem na Austrália inteira. Eu nem sei o que é um trem. O único que andamos foi aquele suspenso que dava a volta por cima de Darling Harbor, mais para turistas e bem pequenininho. Hoje em dia ele nem existe mais, só os trilhos suspensos. Como é que eu vou fazer?


Lá vai eu procurar um trem nesse emaranhado de linhas...
Perguntei ao motorista, e ele me falou, “olhe, você desce aquelas escadas rolantes, que ficam próximas à tal parada de ônibus, e vai lá pra baixo que você acha como fazer”. Okay. Lá vou eu me enfiando naquele buraco imenso. E ando, e ando, e procuro um policial, um funcionário qualquer pra perguntar como é que eu faço pra comprar um ticket, pra localizar um trem, pra embarcar, e nada. Não se encontra nada disso na Austrália, é você por si próprio, entregue às baratas. Nas paredes uma profusão de códigos de linhas, horários, o diabo a quatro, uma loucura, não dava pra entender nada.


Pois é, a estação central é velha pra caramba...
Finalmente em minha direção vem uma senhora sem fones de ouvido. Sim, porque praticamente todo mundo se isola do mundo atrás de seus malditos fones de ouvido hoje em dia (até eu mesma), parece até de propósito. Fico imaginando como é que se viram estas pessoas que vem pra cá e mal falam Inglês, pra destrinchar uma situação como esta. Deve ser um sufoco atrás do outro.

“Minha senhora, como é que eu compro um ticket de trem aqui? Onde?” “Ah, minha filha, pegue este corredor e vá até o fim, mas ao invés de subir a escada no final dele, dobre à esquerda”. “Obrigada, minha senhora”, e lá fui eu, andando léguas dentro de um corredor imenso, cruzando com aos alienígenas dos fones nos ouvidos, até chegar no tal lugar que a mulher falou. Surpresa! Um imenso salão com 4 filas enormes. 2 filas para caixas eletrônicos, 2 filas para pessoas humanas. Lógico que fui pra fila de pessoa humana. Estava um calor dantesco.


Corredores quilométricos...
Depois de 20 minutos na fila, finalmente consegui comprar um diabo de um ticket. E que ticket caro, minha gente, uma passagem só de ida custa quase 4 dólares (cerca de 8 reais). Eu também teria que saber a que plataforma me dirigir, então perguntei a um chinês na minha frente que me disse para perguntar ao comprar o ticket, caso eu soubesse pelo menos o lugar aonde queria ir, engaçadinho. Mas o infeliz do vendedor de tickets me informou a plataforma errada e me perdi novamente, então um senhor me viu atrapalhada e perguntou se queria ajuda, então eu disse que precisava ir para determinada estação, mas naquela plataforma informada não tinha o meu destino, então ele disse, “não é aqui, siga mais pra frente que é em outra plataforma”. 

Ao chegar na tal plataforma, ela dividia-se em duas e aí me perdi novamente, quando mais um gentleman a quem perguntei aonde pegar o trem me apontou o local. Finalmente entrei no bendito vagão para seguir para o meu destino. Não queria nem sentar, de olho pra não perder a estação em que devia descer.


Trens de dois andares
Prestou não, comecei a passar mal. Fiquei tonta e quando eu olhava ao redor, tudo se mexia de forma desconcertante. Se eu olhava pra frente ou pra trás, os outros vagões iam pra um lado, enquanto o meu ia para o outro, me deixando cada vez mais tonta. Era um trem muito balouçante!


Não estava assim tão vazio...
Daí o desenganado do trem pára numa estação com dois nomes, e um dos nomes era justamente o do lugar que eu queria ir. Oi, como é que é, e agora? Devo descer nesta ou na próxima? Perguntas de novo e concluo que a próxima é mais perto de onde eu quero ir, que é Circular Kay, mas também poderia ir por alí, só que andaria mais. Haja paciência.

Fui para o andar de cima...
Finalmente o trem chega na minha estação. Desço do trem e sigo para o que parecia ser a única saída daquela estação. Nesta minha peregrinação, pelo menos encontrei uma pá de uns 4 ou 5 homens muito simpáticos e galantes que me ajudaram a acertar meu passo. Um deles me falou que aquela era mesmo a única saida, mas quando cheguei lá em baixo, a porta não abria. Esta estação tinha a mais bela vista de Sydney possível, porém já estou cansada de olhar aquela vista.


Vista entediante...
Oi, como é que eu dou o fora desta toca de minhocas gigantes, minha gente? Já estou ficando psicótica. Daí vinha um asiático sem fones de ouvido e eu perguntei, “meu senhor, esta porta não quer abrir pra eu sair, dá pra você arrombá-la para mim?” "Ah, a senhora tem que passar com seu ticket naquelas borboletas e então conseguirá sair da estação”. “Obrigada, desculpa minha ignorância, é que não estou acostumada a tomar trens”. Parecia os canberranos que se vangloriavam de dizer sempre na minha cara, "eu nunca tomei ônibus na vida". Em Sydney, pelo menos, ninguém pode dizer tal asneira, só com relação a trens...


Trens balouçantes (foto de RailPictures.net)
Lá dentro da toca estava um calor fenomenal, e quando cheguei na casa da minha amiga, depois de subir uma ladeira bastante íngreme, estava toda esbaforida. O que em geral leva uma hora para eu chegar lá, hoje me tomou 2 horas e meia! O que vocês acham disso? Vocês acham que é viável morar numa cidade caótica como esta, e ainda dizer que é uma das melhores cidades do mundo pra se morar? Se isso for verdade, eu acho que prefiro o inferno de Dante.


Cheguei no meu destino 2,5 horas depois
E agora, como é que vou voltar pra casa? A cidade está estagnada, ninguém anda nem pra frente, nem pra trás, só por baixo do chão, dentro de minhocas gigantes que lhe deixam tonta. Eu não quero passar por outra dessa de ter que pegar outro trem chacoalhante. Minha amiga vai ter que me levar pra casa. Ops! Mas como é que ela vai conseguir sair de casa? Será que tem alguma outra via livre pra se trafegar? Eu não sei o que vai acontecer, fica pro próximo episódio.

Pelo menos embaixo do chão os guindastes caindo não atingem nossas cabeças...


Não, não estamos na Índia...
Bem, o próximo capítulo é agora porque já voltei pra casa para terminar este post. Minha amiga me trouxe lá pra de noite, utilizando umas ruas alternativas.

Quem quiser aprender a pegar trens em Sydney, aprenda aqui, se for capaz:

http://sydneymovingguide.com/train/

Para quem ama trens em Sydney e clássicas fotografias em preto-e-branco:

http://foundinthesubway.com/

Quer saber como são as estações de Sydney?

http://www.flickriver.com/photos/brianapa/sets/72157603586873135/

Quer conhecer mais um pouco da Sydney pra turistas? Este é um raro bom vídeo. Dá pra ver até as mulheres bêbadas caídas na sarjeta da noite e duas cenas da Estação Central de trens a qual só conheci esta semana.

https://www.youtube.com/watch?v=kRI-_04Xlmo&feature=player_embedded

Apesar das minhas reclamações diárias, nada se compara a isso aqui, se for verdade:

http://olhosinquietos.blogspot.com.au/2013/08/a-viagem.html

Nenhum comentário:

Postar um comentário