segunda-feira, 30 de abril de 2012

Despedida


Oi, minha gente.

Cheguei ao fim do meu blog. Já contei tudo o que tinha que contar, sem me repetir.

Espero que todos tenham se divertido com o tanto que conseguiram ler.

Mas antes, resolvi escrever este último post sobre um assunto que li no jornal e que me deixou atônita. Desejo compartilhar com vocês.

Outro dia meu filho me falou, mas olha o problema do primeiro mundo, “meu novo telefone celular não tem flash”, uma frase proferida pela minha filha ao trocar de telefone ultimamente. Ele falou, com tanta gente passando fome na África e essa é a preocupação do primeiro mundo.

Foi uma expressão muito inteligente e interessante, mostrando que ele é um jovem consciente das coisas, graças a Deus. E é claro que ela na realidade não se importou com a coisa, mas a propósito disso, estou escrevendo este post que fala exatamente sobre isso, os problemas “absurdos” e inconcebíveis do primeiro mundo, capazes de cegar as pessoas para a realidade mundial. Não é à toa que a Alemanha fez o que fez...



Estocagem

Este é um bom termo para designar aquelas pessoas que abarrotam suas garagens de tranqueira aqui na Austrália.

Acabei descobrindo que isso é mesmo uma doença feia, e tem até nome, “hoarding” (syndrome de estocagem). Trata-se de uma doença mental, uma desordem comportamental obssessiva-compulsiva, onde as pessoas são classificadas como “compulsive hoarders” (estocadores compulsivos). Ela baseia-se no instinto que os animais tem de estocar comida para os tempos de escassez.
Tranqueira
Fui fundo, não é? Mas não fui eu quem resolvi escrachar com os australianos de vez não, saiu na resvista “Good Weekend” (Bom Fim de Semana) do jornal “The Sydney Morning Herald” e eu fiquei surpresa.

A doença é tão feia que pode matar. Tem um caso famoso nos Estados Unidos em que dois irmãos morreram embaixo de 140 toneladas de trecos mantidos dentro de casa, os irmãos Collyer da Quinta Avenida de Nova Iorque, onde moram os maiores milionários do mundo.

Claro que este é o cúmulo de até onde a doença pode levar uma pessoa, mas a maioria fica a caminho disso. Tendo-se tornado totalmente anti-sociais, chegou a um ponto em que o irmão mais novo saia pela rua catando comida no lixo de noite para o irmão mais velho que havia ficado cego. Ambos formados em universidades, o irmão mais novo se considerava inventor e dizia ter inventado uma dieta para curar o irmão mais velho, então ele também colecionava jornais para quando o irmão ficasse curado, pudesse ler e se atualizar com as notícias. Anti-sociais mas por dentro das notícias!

Tudo aconteceu no início do século passado, lá pelos anos de 1920. A paranóia de que lhe roubassem o fez construir armadilhas para todas as portas e janelas, e foi uma destas armadilhas que o matou, antes de toneladas de jornais cairem sobre ele, soterrando-o completamente. O irmão mais velho morreu dias depois por falta de nutrição e desidratação. Foram vários dias para achar o irmão mais novo que estava só a 3 metros de distância do irmão mais velho, porém coberto de jornais e cacarecos.

Bem, esta história é chocante, mas me impressionou muito. Agora sei explicar o que acontece com o povo daqui, e ao invés de raiva, a gente passa a ter é pena.

Diz o jornal que as pessoas adquirem um laço com o objeto, como se fosse pecado jogá-lo fora.

Estas pessoas atacadas desse mal enchem suas casas de trecos e depois não tem coragem de se livrar deles. Chegou a um ponto em que uma família na Austrália comprou outra casa do outro lado da rua para começar a enchê-la também de trecos, porque já não dava mais pra viver na casa anterior, e eles também não esvaziaram ela, preferiram se mudar. Quer dizer, dinheiro para estas pessoas não é problema. Só sendo doente mesmo pra não ver como se poderia usar tal dinheiro muito melhor, fazendo o bem a tanta gente.

Por aí você vai tirando conclusões sobre tudo o que eu tenho escrito aqui, de como é o comportamento deste povo, e de suas ligações familiares, sentimentos uns para com os outros, família e tal. A coisa é feia desse jeito.

A reportagem diz que a síndrome pode ter a ver com a carência. Pessoas que nasceram pobres costumam acumular coisas que nunca tiveram como se fossem preciosidades. Em outro exemplo dado, uma senhora tornou-se incontrolável depois de ter acabado dois casamentos e a filha fugido com um rapaz aos 16 anos. Quer dizer, tem deficiência de comportamento baseada em dificuldades de relacionamento embutidos na razão desta síndrome.

As pessoas sabem que tem alguma coisa errada, mas não conseguem controlar.

A mesma mulher que falei acima, uma mulher cuja mãe não lhe respeitava e um dia deu todas as bonecas e casinhas dela para a beneficência sem consultá-la primeiro, dizendo que ela já estava grandinha para aquilo, começou a acumular coisas quando se tornou profissional independente, e comprou tudo de volta, o mesmo tipo de bonecas e casinhas, entulhando em casa, com a intenção de dá-las para sua filha, que acabou não dando.

O pior é quando a pessoa coleciona animais e chega a um ponto em que não dão mais conta da sujeira, e o lugar se torna um chiqueiro odiado pela vizinhança, que começa a denunciar para os defensores dos animais virem recolher os bichos. Estas pessoas agem nas melhores das intenções, mas não tem mais bom senso, perdem a noção das coisas. Isso também é muito comum na Austrália, pessoas viverem reclusas do mundo, se recusando a viver com pessoas, e transferindo seu amor para os bichos, um amor doentio e egoista que não vê o que é melhor para eles, só o que é melhor para si mesmas.

E por falar em chiqueiro, não é preciso nem ter animais para que a casa vire um chiqueiro, isto também pode acontecer só com as pessoas. Um exemplo aconteceu em um bairro vizinho ao nosso conforme noticiado no jornal da comunidade, em uma “Boarding House”, assim como é chamada uma pensão, aonde viviam 7 pessoas dividindo o mesmo teto. Eles viviam num ambiente degradante aonde a sujeira tomou conta de tudo e acabou dizimando uma a uma das pessoas por causa da total falta de higiene. Todos adoeceram por conta da situação que ficou insutentável, e dentro de 2 anos todos acabaram morrendo do mesmo mal.  

Isto é o cúmulo do egoísmo? O cúmulo da solidão? Como é que ninguém é capaz de explicar isso, que para mim é tão óbvio, como boa brasileira, claro?

É o cúmulo da falta de amor, minha gente.

Fiquem com Deus.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Austrália Invisível

Ultimamente escrevi sobre os insetos e os perigos que nos rondam quando não sabemos de nada sobre um país em que vamos morar já crescidinhos.

Isso porque a gente aprende muita coisa quando é criança, e uma delas é a conhecer os bichos que nos rodeiam. Ninguém nunca se lembra desse tipo de coisa quando resolve imigrar pra outro país, mas esta “ignorância” pode ser fatal.

Agora vou escrever sobre coisas ainda piores do que insetos e bichos que a gente nunca viu mais gordos e que podem ser fatais.

Vou falar sobre bichos que a gente nem consegue ver!

Não, não são almas de outro mundo. São bichos que povoam nossa vida diariamente e a gente nem se dá conta de que eles existem.

Bem, no nosso país de origem, a gente aprende a se defender deles desde criancinha. Nossas mães, paranóicas com limpeza e higiene, nos ensinam desde cedo a lavar as mãos, escovar os dentes, tomar banho, e outras coisas mais como não sentar no chão, não usar roupa curta em lugares públicos, não sentar em toalete público, não beber água da torneira, água de bebedouros, saber onde pegar, não comer coisa do chão, não rolar pelo chão, não sentar nas calçadas, não botar o pé na lama, e uma pá de regras de higiene que todo mundo sabe, até mesmo quem mora nas favelas.

Pois é, minha gente, a gente vem pra outro país e a tendência é se descuidar, porque tudo parece tão “limpinho”, sem papéis nem sacos plásticos voando pelas sarjetas... cala-te boca. Isso é que os brasileiros mais notam quando visitam o exterior, “é tudo limpo, não se vê um papel no chão". Geralmente eles se referem às fotos. As pequenas sujeirinhas não costumam sair em fotos, a não ser que você queira que elas saiam e bote o fóco nelas.

Então, de repente, você se vê às voltas com outras coisas que não conhece, que não foi ensinada.

Aqui na Austrália, por exemplo, criança senta no chão, rebola, se deita, come coisa do chão na frente dos pais, os pais fazem a mesma coisa. Já falei que as chupetas não tem tampa, quando caem no chão, as mães lambem e botam de volta na boca do bebê. Não se lava as mãos, é famosa a história entre os homens que vão no toalete e não lavam as mãos, e depois pegam na maçaneta. É como se os outros pegassem nos ... deles, mas ninguém se lembra disso.

As pessoas usam toaletes em todo canto, e as mulheres ainda deixam eles entupidos de... bem, vocês sabem o quê. Aqui não tem aquele batalhão de zeladores e faxineiros que tem no Brasil em toda parte, em guarda pra limpar tudo. Aqui não tem empregados de limpeza, e quando tem, são a nível industrial, passam de arrastão sem prestar atenção exatamente no que estão fazendo, munidos de suas máquinas infernais.

Eles acreditam na química, então você costuma encontrar detergentes nos super-mercados marcados como “hospitalar”, ou seja, da pesada. O povo usa estas coisas e depois caem doentes e não sabem porque. É química braba, cada uma pra um canto da casa. Na cozinha, quando lavam os pratos e panelas, o jeito “australiano” é encher uma pia com água e sabão, e lavar tudinho ali mesmo. Como se não bastasse a água não ser bastante pra limpar tudo, também não tem como tirar o sabão. Então eles mergulham ali e botam pra secar, ou secam com o pano-de-prato, com sabão e tudo. No outro dia todos estão comendo restos de detergente, e depois não sabem porque caem doentes com doenças estranhas e únicas. 

Cuba cheia, mas não é o país, e da pia

Nada de água corrente, talvez com medo de desperdiçar água preciosa, pois tanto água quanto energia (de máquina de lavar pratos) custam uma exorbitância. Nada de enxaguar a louça lavada na cuba cheia de solução borbulhante. Vai tudo pra dentro do seu estômago. Agora, imagine que se todo mundo é assim na Austrália, também é assim nos restaurantes, então todo mundo come e bebe detergente todo dia, pois sabe-se lá como eles lavam os pratos. Refrão: “depois não sabem porque estão doentes”…

Esqueci de falar nos orgânicos, aparecendo cada vez mais...
Ontem, um noticiário na TV mostrou um problema que está levando as crianças para o hospital com intoxicação causando tosse e cansaço, provocados pelos aquecedores das escolas públicas daqui de Sydney, que o governo prometeu substituir e não fez nada até agora, levando já mais de 6.500 crianças aos hospitais. Eles disseram que precisam tomar providências mais urgentes porque daqui a pouco os custos hospitalares serão maiores do que as trocas dos tais aquecedores. Dinheiro, custos, sempre a maior preocupação deles, seres humanos vêm depois.

Aquecedores centrais costumam ser movidos a gás encanado vindo da rua, mas os preços são absurdos. Estes aquecedores soltam uma poeira no ar que vão pra seus brônquios e a casa nunca fica limpa. Se você substitui por aquecedores elétricos, mais caro ainda. Se usa lenha, estará poluindo o ambiente com a fumaça que sai pela chaminé, além de causar uma sujeira de fuligem danada na casa, sem falar de que, quando você encomenda e lenha, o caminhão entrega na calçada, e você é quem tem que pegar no pau e botar no fundo da casa. 

Inimigo invisível e lenha (do artista chinês Liu Boli... tem um homem aí, presta atenção)

Turista acha muito bonitinho aquecedor central, e tem gente que se gaba de colocá-lo a 30 graus pra andar de roupa sumária em casa, esnobando o frio. No final de três meses vem a conta, e o sujeito cai pra trás, tem que telefonar para parcelar…

Lareira bonitinha, aconchegante, mas poluente
Este post homenageia os... germes! Isso porque a coisa mais fácil do mundo é você adquirir germes e doenças aqui na Austrália. Eu sei, o clima ajuda, mas o que causa tanta doenca per capita nestas pessoas é mesmo a famosa e prosaica falta de higiene. Basta dizer que o país é recordista em infecção urinária em mulheres e outras pequenas doencinhas daquele lugar quentinho e húmido, o paraíso das bactérias. Crianças crescem assim, viram adolescentes assim, casam assim, e passam pros maridos assim.

Bonitinho mas perigoso, bio-terrorismo dos vírus e bactérias
Como se não bastassem os famosos novos vírus que aparecem não sei de onde, que vem “do ar”, como diz uma amiga minha, e os médicos já não sabem nem mais o que diagnosticar e decretam simplesmente, “você está com virose”, e tome antibiótico.

Já falei aqui também que uma das profissões que mais dão doenças nas pessoas é a profissão de babá de criança. Isso porque as crianças ficam doentes e não são cuidadas, então passam para as babás nas creches, daí uma babá fica doente todo mês. Some-se a isso o batalhão de antibióticos e logo eles não farão mais nenhuma diferença na pessoa. Ela estará pronta pra outra coisa pior. E o que não falta são doenças estranhíssimas. 

Por isso a TV só fala em doenças, fala-se em câncer a todo minuto, em toda parte. Passa-se seriados sobre doentes, pacientes, doutores, médicos, hospitais, equipamentos hospitalares, técnicas avançadas milionárias, enfim, o mercado da saúde aqui não é brincadeira, é bilionário! É insuportável. Claro que mudo de canal imediatamente.

Todo mundo sabe que a indústria farmacêutica á a vilã do momento nos mercados mundiais, faturando mais do que tudo, mas ninguém pode avaliar a dimensão das epidemias se não vive no país a bastante tempo pra somar tudo o que viu, leu e ouviu, e concluir que isso não é normal.

Inimigos Invisíveis

Como se não bastasse você ficar à mercê dos micro organismos funestos doidos pra lhe comer vivo, ainda por cima você vive num ambiente super chique e sofisticado onde... tem veneno em toda parte.

Mas como? Ora, esta semana mesmo meu marido estava viajando quando viu sinalização na estrada dizendo para tomar cuidado e usar só a faixa da esquerda, porque na direita tinha caminhonetes borrifando veneno pra matar ervas daninhas. É assim que as estradas são bordejadas com “grama” verdinha.

Envenenando a natureza na era ecológica
E é assim que eles controlam as danadinhas, pra elas não proliferarem e tomarem conta da Austrália, eles botam veneno em tudo. É veneno nas paredes pra proteger contra traças e cupins (lembrem-se, as casas são de madeira), é veneno no chão, e veneno nas comidas processadas, claro, não são chamados de venenos mas é isso o que a química que adicionam à comida nos supermercados é. E a lista não acaba mais, pra onde você se vira, tem química tóxica. E você no meio destes vapores, respirando eles alegremente, crente de que está vivendo num mundo asseado, sem ervas daninhas e coisa e tal.

Pra tudo o Australiano tem um “jeitinho científico”, uma substanciazinha micarulosa. Mas até pra isso é preciso você fazer um curso (exagero minha gente), porque a gente vem de um país aonde adquirimos outros costumes mais naturais, e tem que aprender a usar cada uma destas substâncias maravilhosas que eles criam, e que todo mundo conhece, menos você. Então quando alguém sabe do seu problema, vem com uma tal fórmula mágica, “porque você não coloca essa coisa e tal?” E você, com a maior cara de tacho e ignorância, exclama “nunca ouvi falar disso”.

Essa é a pior inimiga, a ignorância. Com alguns anos você passa a desenvolver uma destas doenças estranhíssimas que custam pra ser diagnosticadas, e quando são, a coisa é tão rara que logo jogam você num grupo de apoio, com uma pá de gente com o mesmo problema, daí você não se sente só e condenada, sabe que vai pro buraco com mais uma porção de pessoas pelo menos.

Tem o tal do asbesto, conhecido no Brasil como amianto, que aqui agora anda matando muita gente de câncer. Ele era usado em várias partes das casas, e hoje em dia, depois de algumas décadas, estão se quebrando e liberando suas toxinas. As pessoas viveram décadas nestas casas e escritórios, pessoas trabalharam com o material instalando, removendo, remodelando, e agora tá todo mundo com câncer, quer dizer, quem ainda não morreu, processando as empresas que já faliram e não tem mais dinheiro pra pagar.

Telhas de amianto (asbesto) usadas no Brasil
Mas, sinceramente, tem muita gente aqui que fala isso assim, abertamente: “se houvesse algum problema, o governo já tinha tomado providências”. Ah, meu Deus, é o cúmulo da ingenuidade. Mas também, o que se pode esperar de uma pessoa que sempre teve tudo na vida e nunca precisou fazer nada, ou pelo menos, só precisou trabalhar pouco num empreguinho peba? Eles acham que o mundo é perfeito, e tudo é exagero, que está tudo bem, que as doenças são normais, pois afinal, quem não as tem? As pessoas viram “massa” ignóbil em todo canto.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Casa e Jardim

Casas feitas de palitos de fósforos.

Pois é assim que se constróem casas na Austrália. Uma cultura herdada dos ingleses e norte-americanos. O nosso pedreiro aqui é carpinteiro. 


Paliteiro
Na realidade tem um pouquinho de tijolo. A casa começa assim: monta-se uma gaiola das loucas feita de madeira, depois sai-se tapando os buracos com um material azul. Deve ser alguma espécie de isolante, e por fim envolve-se a armação com tijolos, mas só por fora. O resto das paredes é feito de gesso. Por isso no cinema de vez em quando alguém dá um soco na parede e o pulso sai do outro lado. Vá fazer isso nas paredes brasileiras.

E o pior é que eles consideram casas de cimento e concreto anti-ecológicas! Meu marido quis saber porque e responderam, você sabe quanta energia é dispendida pra fazer cimento? Virgem, é outra realidade mesmo, outra cultura, outro mundo.

A tal da energia para nós brasileiros não é poluente pois vem dos rios, das hidrelétricas, porque no Brasil tem mais rio do que no resto do mundo todinho amontoado.
Além disso, o sistema torna nossa energia muito mais barata, mas muito mesmo. Mas as energias deles vem de carvão, gás ou usinas nucleares, ou seja, absurdamente poluentes. Além de tudo, no Brasil tem muito concreto, mas nos outros países não tem. Enfim, é outra realidade mesmo, não dá nem pra discutir. O Brasil é tão rico...
Quer dizer, não é que eles usem tecnologia “mais moderna” pra suas construções, é que as realidades são diferentes.
Por isso quando tem incêndio, o fogo consome tudo como o fogo consumiria uma caixa de fósforos assim: tchump! Além da Austrália ser campeã em incêndios, ainda por cima tem telhado de vidro, quer dizer, tem casa de madeira. É pedir pra arder nos infernos.

Caixa de fósforos em chamas
Então o que tem de casa e apartamento rangindo não está no gibi. É bom pra pegar marido chegando de mansinho no meio da noite, a casa avisa. Quando íamos visitar casas pra alugar ou comprar e o chão rangia sob meus pés, eu dava meia volta e ia embora. Onde já se viu casa ranger? Como se não bastasse os estalidos de noite, como se tivesse alguém dentro de casa, ou mesmo o barulho da água correndo no banheiro do outro lado da casa, que dá pra ouvir na casa inteira porque as paredes são ocas, e os canos passam por dentro dela em alta pressão.

Pedreiros, digo, carpinteiros, aqui chamados de "builders" (construtores)
Então, o pedreiro é na realidade carpinteiro. Com isso as casas são frágeis demais. Armações de telhado feitas de madeira, vá lá, ao invés de laje. Bem acabadinhas, as bichinhas, tudo ajustadinho, parece impecável, mas soprou, voou, que nem a casa dos 3 porquinhos. Com isso as casas deviam ser mais baratas, não é não? Não senhor. Paga-se os olhos da cara por um montão de palitos de fósforos unidos com grampos e chiclete. Mas tá certo, nada mais certo do que casas frágeis para os porquinhos australianos anti-higiênicos que chafurdam no lixo obsoleto.

E como se não bastasse, a indústria de construção na Austrália parece ser a pior possível. O que tem de defeitos nas casas novas é inaceitável para os padrães educacionais e arrogantes desse povo. Entretanto o mercado imobiliário é o maior negócio da Austrália de todos os tempos. Ora, se o mercado é tão bom, pra que fazer casas melhores se o povo compra qualquer porcaria? As casas de 4 metros de largura na minha vizinhança vendem no mesmo dia em que são anunciadas.

Já visitei muitas casas novas de conhecidos e também limpei algumas cheias de defeitos e problemas. É vazamento aqui, entupimento ali, torneira de má qualidade se quebrando, piso rachando, rejunte ficando preto, e a lista não acaba mais. Com frequência eles tem que substituir componentes. Recentemente uma amiga, por exemplo, teve que se mudar depois de 3 meses ocupando um apartamento recém-construído, super-chique, em local altamente nobre, porque deu vazamento dois andares acima que desgraçou as alcatifas do apartamento que ela aluga. Então eles arrancaram a alcatifa fora expondo o cimento bruto e mal acabado, a sujeira embaixo do tapete. E assim ela passou uns bons 2 meses, com o apartamento desse jeito.

E olhe que aqui na Austrália tem um lance interessante: você contrata uma empresa pra construir sua casa, e ela lhe dá um menu pra você escolher dentre os vários modelos padrões. Qualquer coisa que você troca no modelo padrão, paga bem caro por isso. Conhecidos nossos acrescentaram uma pia ao toalete e construiram outro banheiro, tudo pago por fora.

Estou cansada de ver prédios de apartamentos em Sydney rachados de dar medo, até o que moramos tem rachaduras em toda parte, como na cozinha, banheiro, sala e até na escada. As janelas modernas são de vidro na maioria das casas e apartamentos de Canberra e Sydney, mas a moldura é tão frágil que se você forçar, ela entorta. Se você furar com uma furadeira, parece uma folha de papel. Super ajustadinhas, com vedações totais, mas assim, desse jeito, precário.

Ah, e é um tal de cair varanda. Cai várias varandas por ano, com pessoas em cima. Eles fazem festas em varandas precárias de madeira, e elas não aguentam o peso, vindo abaixo com todo mundo em cima indo parar no hospital. Não sei como é que o povo insiste em fazer festa em varanda de casa e prédios. Pelo menos as que caem são nas casas, mais perto do chão do que as dos apartamentos altos. 


Na casa de um amigo nosso, perto de um millhão de dólares, a varanda é de madeira com ripas afastadas, quer dizer, não adianta se abrigar da chuva embaixo dela. Ela rodeia a casa inteira, um verdadeiro “avarandado” no primeiro andar, mas o parapeito feito de ripas de madeira é preso por vigas de ferro mixurucas. Tão mixurucas que estão cedendo. O diabo é quem se debruça no tal parapeito. Quer dizer, uma varanda de meter medo, melhor não tê-la. Tem que andar com cuidado, pisando em ovos. Quer dizer, eles não ligam, somos nós os medrosos e preocupados.

Pisando nos ovos

Serviços de Carregação

Não, não estou me referindo aos táxis nem aos estivadores do porto que carregam coisas e pessoas, estou me referindo à má qualidade dos serviços.
Os serviços cada dia vão se deteriorando mais aqui na Austrália. É uma verdadeira loteria você contratar alguém que sabe fazer um serviço impecável. Existe, mas grande parte é de dar medo. Medo de que façam porcaria.

Encanador
E a falta de padrão? Meu marido queria ser arquiteto quando era jovem, chegou até a estudar os padrões e medidas arquitetônicas da construção civil na escola técnica, depois disso passou a observar que todas as construções brasileiras obedecem àqueles padrões de largura mínima de corredores, dimensão de degráus, tamanhos de portas, alturas de tetos, o escambau. As normas só não são respeitadas por aqueles arquitetos de fundo de quintal que constróem suas próprias casas, daí eles cometem atentados.

Canos nos palitos
E na Austrália? Existe tal coisa chamada padrão ou norma? Parece que não, ou é muito relaxado. É frequente você se deparar com uma pia minúscula, onde você tem que escovar os dentes como no Japão, de joelho e batendo com a cabeça no espelho, e isso em casas imensas. É comum você ter um toalete separado do banheiro sem pia, consequentemente quando você se suja, tem que pegar em duas maçanetas pra lavar as mãos no banheiro contíguo, uma idéia de girico e triste de quem vai depois de você. É comum você nunca saber pra que lado abre uma porta, porque não tem padrão. Dificilmente no Brasil uma porta abre pra fora do cômodo, a não ser se for um armário.

Pia minúscula na Inglarerra também
Frequentemente você tem cômodos no interior da casa sem iluminação nem janelas, então as pessoas colocam clarabóias no telhado que ficam muito bonitas e iluminam o ambiente com a luz solar, mas muitas vezes elas se enchem de insetos mortos que não são retirados.

Luz e mosquiteiro natural
É comum você mandar fazer uma calçadinha no seu quintal e com o tempo ela afundar parcialmente, lhe dando um tombo.

Você descobre que tudo está torto quando encomenda cortinas ou guarda-roupas embutidos. Logo você vê que as persianas não encaixam direito porque a janela é mais larga em cima do que embaixo, ou as portas corrediças com espelhos imensos só fecham bem de um lado, porque quando trocam de lado, elas estão fora de esquadro. É que na hora de construir, eles adaptaram as portas para as torturas da parede.
É uma tortura.

Espelho demais, não é não? Quarto fica parecendo motel...
Outra coisa esquisita: você vai andando no shopping e de repente sente uma tontura, pensando que vai cair. É que o chão se move. Não é que ele se mova, mas você não espera que hajam desníveis no meio de um corredor entre uma loja e outra, ou mesmo ladeirinhas. Pois é isso o que acontece dentro dos shoppings, porque eles vão aumentando assim, construindo-se aos pedaços, e muitas vezes aparecem os desníveis e eles não estão nem aí pra nivelá-los, você que cuide do seu labirinto. Que me conste, isso não acontece no Brasil em lugar nenhum, mas aqui até mesmo no meio de um super-mercado, o carrinho sai deslizando, escorregando sozinho e batendo nas prateleiras. Tem fantasmas no super-mercado? Não, é que um lado do corredor é mais baixo do que o outro, e o mercado inteiro é todo desnivelado. Só quem “nota” é o carrinho e seu labirinto. Até a escada rolante é inconstante.

Você não está com labirintite, é o chão desnivelado mesmo
E a seara dos mal feitos não tem fim. Que tal um box de chuveiro de um apartamento ou casa novos cuja água não corre para o ralo de jeito nenhum, ficando empossada, obrigando-lhe a tanger a água com um rodo toda vez que acaba o banho, senão fica estagnada e pode até criar mosquito da dengue? Você vai saber que a casa ou o apartamento vai ser assim quando compra na planta? Foi o diabo do pedreiro da sua propriedade que fez um serviço de qualquer jeito, não quer dizer que o complexo inteiro seja do mesmo jeito. Azar o seu. Também existem as torneiras desalinhadas. Duas torneiras numa mesma pia, uma você torce, a outra lhe machuca porque está muito junta da parede. Dá vontade de torcer o pescoço do carpinteiro vulgo pedreiro.

A População do Jardim

E que tal você contratar um paisagista para planejar seu jardim, e ele colocar plantas e árvores que requerem podagem semestral, e daqui a 6 meses ele já vem ali, pronto pra fazer a podagem, você não precisa nem estar em casa, que a conta vem pelo correio. Não senhor, me poupe, quero não, pode desistir. Deixe que eu chamo o senhor, nada de aparecer aqui desse jeito. Mas que desplante!


Arbustos maiores do que a casa
Acabou que uma amiga minha virou refém do jardineiro que engolia seu dinheiro para podar suas plantas constantemente. Tão bonitinho, não é? Em uma hora ele poda tudo com suas máquinas possantes e vai embora, às vezes junto com a mulher. E ela achou de recomendar o tal jardineiro boa pinta para mim! Boa pinta uma pintchura! O danado plantou "entas" árvores no quintal, e depois apareceu para podá-las. Levou um fora tão grande que nunca mais apareceu. Em compensação nos deu um abacaxi pra descascar. As árvores cresceram tanto que passaram da casa e entupiram as calhas. Podá-las se tornou impraticável tal a voracidade das plantas endiabradas e a grossura dos troncos.

Sacos e mais sacos de folhas secas
Coisa interessante, elas ao invés de perderem as folhas no outono, perdiam no verão. Então enchiam de folhas secas justo quando a temperatura estava quente, um pavio curto pra tocar fogo. O resultado foi um dos maiores programas de índio da minha vida: encher sacos de 1 metro de altura toda semana, com folhas secas, juntar 8 sacos, colocar no porta malas do carro e levar tudinho no depósito de lixo, enfrentando uma fila de carros na poeria, batalhando uma vaguinha pra descarregar o conteúdo dos sacos na montanha de plantas podadas jogadas pelos outros (muito mais do que nós!). 

Belo programa de domingos, mas o povo de Canberra gosta, assim eles tem o que fazer! Acabei permitindo meu marido comprar as maquininhas que os homens tanto adoram. Fora o cortador de grama e o podador elétrico, veio este soprador/sugador, um aspirador de folhas que ora tange elas e junta em montinhos, ora suga elas pra dentro do saquinho dele, que tem que ser esvaziado do mesmo jeito. Uma verdadeira pachecada! Era bom que dalí mesmo as folhas fossem incineradas e desaparececem, não era?

Mala grande, 6 sacos, mais 2 nos assentos traseiros, uma vez por mês
Enfim, jardim e quintal em Canberra consomem muito tempo. Tem gente que gosta, mas essa gente não sou eu. E é um tal de comprar sementes de grama pra tapar os buracos, plantas ganhas em potes que morrem seja porque levam sol demais, ou sombra demais. O lance de sair rodando na casa pra encher os potinhos com água é um saco. Melhor ter plantas artificiais, elas estão tão perfeitas hoje em dia quem ninguém diz.

Programa de índio de domingo em Canberra, descarregar folhas no TIP
E as ervas daninhas? Tomam conta de tudo, e tem umas com espinhos, danadas da vida com a nossa presença, nos enxotando. Os jardineiros colocam plástico no chão das jardineiras e cobrem com o que quisermos. Cobrimos com pedrinhas brancas, mas elas acabaram sumindo, afundando no meio da terra, então recobrimos com “bark” (casca de árvore) picado e pintado de vermelho. 

Galinhas voadoras e chorosas que lhe atacam quando estão procriando


Os “magpies” (fala-se “megpáis”, enormes pássaros que se parecem com galinhas e grasnam como se fossem bebês chorando) então vinham e cavavam o “bark”, espalhando no passeio da entrada da garagem à procura de minhocas que sobrevivem ao veneno químico, mais trabalho pra mim.

Descarregando...
Eu odeio minhocas, que nojo! E pra piorar, quando chovia lá em Canberra, a entrada do carro ficava cheia de lesmas nojentas. Sem falar nos aruás e caracóis gosmentos. Paguei todos os meus pecados, eu, urbana do jeito que sou, de cidade grande.
E ainda bem que o racionamento de água foi decretado em Canberra e passamos uns bons quatro anos sem poder mais aguar a grama nem lavar o carro (meu marido adorou). Resultado, ela secou, ficou espinhosa e cheia de buracos e ervas daninhas. Umas plantas morreram e foram arrancadas, e alguns arbustos passaram 8 anos e não cresceram nem um centímetro, uma verdadeira proeza, nem morriam, nem cresciam. Os jardins de Canberra foram secando todos, muita gente trocou a grama por “bark”, serragem ou pedras, mais um pouco e Canberra iria ficar parecendo com Texas, só faltando os cactos.

Plantas que não cresciam, rosas que espetavam, aruás, minhocas e lesmas gormentas
E até a profusão de rosas que o dono anterior da casa havia plantado, plantas de girico, me espetavam toda quando eu tinha que cuidar das bichinhas, podando-as, matando-lhes os fungos.
Bonitas de olhar...
Eu, espetada e cercada de minhocas gosmentas! Vai ver tem gente que gosta…

E o pior, quando minha maravilhosa “hay fever” (febre do feno) me atacou, eu não podia mais respirar grama cortada e ajudava menos o meu marido a descarregar o cortador de grama e colocar a grama picada nos sacos de lixo bio-degradáveis. Ah, por sinal, seria uma boa idéia os tais sacos bio-degradáveis, porque jogaríamos os restos de plantas com saco e tudo no lixo, se eles não bio-degradassem antes de chegar no depósito de lixo! 

Tentativa de fazer jardinagem...
Ah, quanta coisa errada nesse país, quanta experiência, ou melhor, quanta inexperiência bancada com o seu dinheiro, experimentando e você pagando, quanto dinheiro jogado fora!

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Um Causo no Ônibus

Lá vai eu faceira viajando num ônibus sentadinha, quando de repente ouço uns gritos, um chororô de criança. Olho pra trás e vejo uma menina a chorar. Sua avó, ou uma mãe assim mais idosa, ou até mesmo simplesmente alguém que estava tomando conta dela, sentada bem longe, mal olha pra menina. Os gritos vão aumentando, o pavor da menina, e se descobre que ela estava com o braço preso entre os assentos, sem conseguir tirar. Nisso 3 homens resolvem ver o que está acontecendo. O motorista pára e fica lá, esperando, observando, sem fazer nada, inerte. Dois homens desistem e um mais forte resolve livrar a menina. A mulher não sai do canto, não diz obrigado, nem sequer pisca.

No ônibus
Esta á a vida australiana. Por isso quando acontecem desgraças, as pessoas dão declaração na TV sorrindo. Nunca estão chorando, com os olhos vermelhos, ou aparentando sofrimento. É como se tudo fosse corriqueiro e sem importância. A mãe pode ser fulminada por um raio que a filha vai dizer sorrindo que foi má sorte da mãe e depois vai subir no palco do velório pra falar sobre as coisas engraçadas que sua mãe fazia, a fim de divertir as pessoas.

No início nós pensávamos que o povo era mesmo resistente e superava as desgraças com um sorriso nos lábios, que eles tinham uma educação a ser assimilada por nós, que por sermos latinos tendemos a dramatizar, aumentar o sofrimento, chorar, dar escândalos (aqueles com menos educação). Eles diziam “são só coisas materiais que a gente repõe, o mais importante é que estamos vivos, escapamos”, como se fossem espiritualizados e acreditassem em algo além da morte. Mas não, não é nada disso.

Para nossa decepção, trata-se de desculpas fáceis na ponta da língua para isentá-los de qualquer responsabilidade ou sentimento. Quando eles dizem assim, camuflam que não estão sentindo absolutamente nada. Quantos deles (ou delas, principalmente) não tem uns óculos escuros bem à m
ão para pensarem que estão ou estiveram chorando? Quem vai se atrever a retirar os óculos deles pra ver se estão mesmo?

Dick Smith discursa no funeral da primeira aviadora australiana, falecida aos 93 anos (Foto de Sergio Dionisio/Getty Images AsiaPac)
A gente vê a diferença quando as vítimas de tragédias são de outras raças pois estes choram e sofrem de verdade. É estampado no rosto deles, mesmo que não estejam chorando no momento infalível das entrevistas para a TV, vê-se que estiveram a chorar ou a sofrer, não têm o tal sorriso hipócrita nos lábios, sorriso de apresentador de TV.

 
Durante funeral de refugiados, quanta diferença
Aquela mulher do ônibus simplesmente se comportou como se não conhecesse a menina, como se não adiantasse nem se levantar pra ver o que estava-se passando. Pessoas sem sentimento. 

Fico comparando as cenas como se fosse no meu Brasil. Se isso acontecesse, a suposta “mãe” iria fazer um escândalo, mandar parar o ônibus, chamar o motorista pra retirar a menina, e todas as pessoas do ônibus iriam se aglomerar tentando ajudar, e os três homens de uma vez iriam desmontar o assento pra livrar a menina. Então a mãe iria agradecer a todo mundo, pedir muitas desculpas, e ainda ficar falando um monte de coisas, tudo o que viesse em sua cabeça, além de repreender a menina por andar fazendo o que não devia, estar longe dela, e tudo o que tivesse direito.