quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Os Homens Australianos

Os homens australianos se dividem em dois tipos: os pulsilânimes e os agressivos.

Os pulsilânimes tem medo de mulher, e os agressivos, bem, a palavra já explica.

Ontem quase fui vítima dos agressivos, já que vítima de pulsilânime ninguém é. 

Não é nenhuma capital de Roráima, mas é uma Boa Vista...
Estava numa esquina esperando o sinal de pedestres abrir para eu atravessar e tinha um único carro parado no semáforo. Nele haviam 4 homens numa grande algazarra bem conhecida dos jovens bêbados australianos. Fiquei apreensiva principalmente porque eles começaram a se dirigir a mim, sem ninguém ao redor. Vi que no banco de trás estavam os mais audaciosos, os quais tinham cara de oriente médio.

É importante frisar serem eles de aparência de oriente médio porque estes costumam ser os mais inconvenientes. Vocês sabem, né? Todo cidadão é considerado australiano, mas a realidade é diferente.

Assim como eu sou cidadã australiana mas me considero totalmente brasileira, a maioria dos cidadãos naturalizados australianos não se comporta como tal. Isso é óbvio porque, para nos comportarmos como australianos, seria preciso ter nascido aqui ou termos chegado quando criancinha, caso contrário é muito difícil mudar os hábitos adquiridos em outro país, ou mesmo pode não haver interesse em mudar. Mesmo que a pessoa force o comportamento australiano e até só fale Inglês dentro de casa como uma pá de brasileiros traidores da pátria, o máximo que eles conseguem é que os filhos esqueçam a língua mãe e os hábitos do país de origem e se tornem estranhos constrangidos quando vão lá visitar os parentes. 

Voltando ao cruzamento, foi quando um dos passageiros de trás daquele carro incitou o outro para abrir a porta e "me pegar". Exatamente nessa hora o semáforo abriu para eles, para a minha sorte, pois eu já estava tremendo. Eles falavam coisas entre si e para mim, mas eu não entendia, Não costumo entender nada quando as pessoas falam assim, fora do normal.

Meu marido disse que era esparro do idiota, que homens (e mulheres) se sentem fortes quando estão acompanhados de outros iguais a eles (como prova o outro incitando aquele a descer do carro e "conversar" comigo), mas aqui na Austrália existe o absurdo costume destes tais homens raptarem mulheres, não importando a idade, e lhes agredirem sexualmente, quando não abandonam seus presuntos nos córregos, canais ou valas no meio dos matos ou parques das cidades.

Não posso dizer que os pulsilânimes são os australianos louros ou carecas nativos, criados por mães feministas solteiras e liberadas, porque, no meio deles, tem muito jogador de rugby que se comporta como animal bem como certos imigrantes estrangeiros de países fora do bloco europeu ocidental, mas posso dizer que a maioria é.

Certos imigrantes não aprendem a se comportar como os nativos australianos, que costumam ter muito mais lábia e hipocrisia para cantar as mulheres quando casualmente eles arranjam coragem para isso.

Num artigo da revista GoodWeekend, também distribuido pelo jornal The Canberra Times, sobre os jovens na era da eletrônica, entrevista com rapazes mostrou que eles usam as redes sociais para conseguirem fotos das garotas sem roupas e espalharem para os amigos para praticarem o onanismo, porque em matéria de relações verdadeiras eles são todos embotados, não sabem nem como entabular uma conversa com uma delas e por isso não transam tanto quando seria de se imaginar. Já as meninas são instruídas pelas mães que não tem nada demais fazer um trabalho de soprar (blow-job) porque é o que todos os rapazes querem sem excessão, mas jamais esperem que eles façam o mesmo com elas porque não sai. Isso quer dizer que, na era da eletrônica, os jovens estão mais virgens do que nunca, resultado totalmente inesperado dos novos tempos de libertinagem e escancaramento de "selfies" e corpos nus pela internet. Suponho que isso seja bom. 

Com essa esse daí ganhava...
Aos pulsilânimes resta o recurso dos sites de namoro em que você conhece candidatos eletronicamente através da internet e depois quebra a cara seguidas vezes, se conseguir sobreviver sem se matar. 

Tiro minhas conclusões também observando os amigos da minha filha, da geração jovem. Para nós, brasileiras acostumadas com o padrão masculino que é de atacar, cantar, nos encher de atenção, tentar de tudo para nos seduzir, o australiano parece um morto-vivo. Os jovens rapazes australianos que são bem comportados me parecem muito pouco afirmativos, mas sei de outros idiotas com quem minha filha não convive pois ela é gente de bem, os quais aparecem em filmes ou são reportados por ela própria através das coisas imbecis e sem nexo que eles publicam em seus Facebooks da vida, levados por garotas ainda mais imbecis e ridículas do que eles. 

Rodrigo Faro, tem gente que não precisa dar cantada...
Ontem mesmo soube de uma garota que minha filha conhece cujos pais são separados e foi curtir os "schoolies" (veja post Diversão dos Jovens Australianos), festas para aqueles que acabaram o Ano 12 e vão entrar ou não para a universidade, a qual é realizada lá na Gold Coast. Ela foi sozinha, com a anuência da mãe e sem o pai saber. Ela nem mesmo terminou o "college" (segundo grau) ainda, pois só tem 16 anos e, chegando lá, transou com qualquer um pela primeira vez. Minha previsão é de que agora ela vai dar em cada poste e logo será mais uma felizarda neste país das mães solteiras. 

A Perfórmance do Velho

Lá vai eu a caminho da ginástica quando passo pelo bequinho cotidiano e vejo um velhinho se arrastando com uma bengala. Passo por ele, me volto e pergunto, está tudo bem com o senhor?

Essa do Zé Bonitinho é picante, elogia e pisa...
Pra que, minha filha? O velho de cerca de 80 anos se empertigou, ficou teso, me encarou e desembuchou, "é o meu joelho, ‘sweet heart’ (doce coração)... mas a perfórmance está ótima" e me agarrou pelo pescoço tão forte que eu tive que fazer uma manobra e sair por baixo e por trás, mas escapei. Tava difícil ele ter força pra mim.

Daí ele continuou falando que eu era uma pessoa iluminada, alegre, que era um raio de luz, me abraçando mais levemente desta vez, só porque eu perguntei se ele estava bem. Eu disse que ele parecia com o meu pai, que tinha o mesmo problema no joelho. Daí ele perguntou, e ele também usa esta bengalinha, e eu respondi, sim senhor, igualzinho. 

O velho estava mais bem vestido mas a
perfórmance devia ser assim...
Este velho continuou caminhando comigo até a porta da ginástica, e perguntou de onde eu era, pois não podia ser australiana. Falei que era brasileira, e ele disse, é claro, você é uma pessoa feliz. Ele falava tão alto que as pessoas passavam olhando para nós. O que eu teria feito para merecer aquela ode daquele homem no meio da rua? Desta vez ele estava com todo o respeito depois que os agarros deram em nada.

Fiquei pasma com a atitude do velho, mas de uma coisa agora estou sabendo. Os homens, principalmente os velhos, fazem questão de falar sobre como está a "perfórmance" deles.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Café Amargo Demais

Martin Place, centro financeiro de Sydney
Nem bem eu inventei de falar dos cafés na Austrália e acontece uma destas. 

Um maluco qualquer inventa de invadir um café dos mais representativos de Sydney, o Lindt Chocolat Café na praça Martin Place, colado com o Banco Central, no coração financeiro da cidade, na frente do Canal 7 de TV, perto de escritórios dos maiores bancos do mundo, escritório do primeiro ministro, consulado dos Estados Unidos, providencialmente, e até o escritório do Itamaraty, pra fazer 15 réfens de pessoas de profissões de nível como a advogada mãe de 3 filhos que acabou morta numa via-crucis de mais de 17 horas, das 10 da manhã da segunda-feira dia 15/12/2014 até 3 da manhã do dia seguinte, junto com o gerente da loja e o próprio sequestrador, todos mortos, causando um bafafá desgraçado na cidade que ainda não parou de falar exclusivamente sobre o assunto em todas as redes de notícias possíveis durante 3 dias.

Lyndt Chocolat Cafe. Apesar de eu adorar a marca de
chocolates Lyndt suiça, nunca fui a este café...
O café (ou cafeteria) é praticamente uma instituição da burguesia australiana, símbolo de sua sociedade. Já que Sydney não tem duas torres monstrengas odiadas de mais de 100 andares no centro como Nova York e nem tem ônibus vermelhos como em Londres, ou uma corrida de Boston (que na realidade tem), acabar com a Ópera House ou a Harbor Bridge ia ser demais, então o terrorista resolveu atacar um símbolo de estimação da sociedade australiana para que eles nunca mais se esquecessem e passassem a não se considerarem mais seguros no centro financeiro da cidade, equivalente ao World Trade Center de Nova Iorque onde cairam aqueles prédios imensos abatidos por dois aviões no náine-eléven. Como um brasileiro falou numa entrevista durante o ocorrido, ele disse que Sydney era muito segura, e o repórter retrucou, segura desse jeito? Daí o repórter perguntou a quanto tempo ele vivia em Sydney. Resposta, uma semana. Estou aqui para passar um mês de férias. Pontinhos...

Calçadão de pedestres em Martin Place, antes da tragédia
O terrorista não tinha absolutamente ligação com nenhum movimento islâmico, assim como todos os outros protagonistas dos atentados naquelas cidades mencionadas acima, que acabaram morrendo para não terem como contar história. Ele se chamava Man Haron Monis, nascido Manteghi Bourjerdi, estava em liberdade sob fiança por mais de 40 crimes de agressão, tinha 49 anos, dizia-se pregador do Estado Islâmico (EI) mas pediu uma bandeira do EI para a polícia porque ele não tinha (!) e era um iraniano que imigrou pra Austrália em 1996. O xeique Haron, como era conhecido o "curandeiro espiritual", flertava com o perigo e a criminalidade, tendo a mulher sido assassinada e ele enviado cartas de ódio contra as tropas australianas no Afeganistão. Um desequilibrado mental que jamais deveria ter sido deixado solto nas ruas, segundo declaracão do primeiro ministro Abott. No dia anterior havia tido uma batida policial num bairro que concentra imigrantes do oriente médio onde prenderam um homem suspeito de estar envolvido nas ameacas que andaram fazendo nas últimas semanas dizendo que iam decapitar membros da populacão de Sydney no centro da cidade.

Cernário do filme The Matrix, em Martin Place, anos atrás
O café foi cercado por 70 homens, dentre eles o que chamaram de os mais inteligentes negociadores de sequestro no mundo. Não funcionou, não sei se porque são incompetentes, ou se era para dar naquele final espalhafatoso mesmo, pois nunca se sabe quais as artimanhas que os governos imperialistas são capazes de fazer hoje em dia para manterem a hegemonia e o poder no mundo.

Pelo barulho das rajadas absurdas das centenas de balas que parecia filme de Holywood, os reféns podem ter sido mortos mais pela polícia do que pelo perturbado mental claramente com problemas psicológicos e provavelmente solto nas ruas a fim de executar seu plano, guiado sabe-se lá por quem.

Prédio do banco do Commonwealth em Martin Place
Ou seja, tudo parece mais uma enorme armação que, para ser divulgada no exterior, para consubstanciar cada vez mais as medidas de repressão popular e chocar o bastante, e para isso é preciso deixar vítimas. E o jeito para nós, pessoas comuns, é apelar para Deus nos proteger, porque nunca saberemos quando um cara destes vai se atravessar na nossa frente. A notícia espalhada por ele de que tem 2 ou 4 bombas em Sydney é uma maravilha para manter todo mundo em pânico.

Alguns reféns conseguiram enviar mensagens para parentes ou até colocar mensagens no Facebook durante o sequestro mas a polícia falou para eles não fazerem isso, é claro, pois assim eles podem contar coisas que não devem. Do lado de fora, pessoas tiravam fotografias "selfies" delas próprias em frente ao prédio da cafeteria, sorrindo e enfurecendo participantes do Twitter ao verem suas publicacões. Ora, Obama pode tirar "selfie" em velório, por que nós não, diriam elas.

Preparação do Natal 2014 em Martin Place, antes da tragédia e
agora mais do que nunca, um lugar de confraternização para
ora
ções de esperança, paz e amor nesta cidade que era segura
Se meu marido soubesse que eu tinha ido para um café cercado por 70 homens, ele se tornaria muslim, me daria uma paulada na cabeca, me cobriria com uma burca (roupa que cobre o corpo inteiro) e me levaria para a caverna.

Brincadeiras à parte que é para não bater depressão, mas a coisa é séria. Pelo menos no Brasil não há possibilidade de você ser degolada (terroristas prometeram decapitar membros do público australiano).

Martin Place tornou-se um mar de rosas depositadas por quem ali
reside ou trabalha
Domo sobre o prédio do banco do Commonwealth em Martin Place,
número 50, prédio construído de 1925 a 1928. Não é um restaurante, 

não é um salão de bailes para reveillon de ricos como qualquer 
brasileiro pensaria, é apenas um telhado de vidro para prover luz 
natural no centro do prédio. Veja seu interior luxuoso e elevadores
de vidro neste vídeo (clique no link abaixo).
https://www.youtube.com/watch?v=vH6EZxpXFMY

Quer um Café?

Já falei aqui que alguns costumes que trazemos do Brasil quando vivemos em outros países como a Austrália nos fazem sentir-nos um pouco incomodadas porque não sabemos exatamente como é que os nativos do país fazem.

Higiene

Café ou chá com bolinhos, foto da Cantina Vettorazzi
em Criciúma, Santa Catarina
http://www.cantinavettorazzi.com.br/
Um exemplo disso é a nossa verdadeira mania brasileira de trazer todo mundo para nossa casa com a desculpa de oferecer um café que acaba sendo um lanche especial ou coisa assim. 

Aqui a coisa não é assim, aliás, é totalmente ao contrário, quando se convida para um cafezinho, é em um café (cafeteria ou cantina) mesmo, pois ninguém gosta de receber pessoas em casa, e quando recebe, é um trabalho muito grande que eles tem para arrumar o lugar para receberem, isto sem falar em preparar realmente só um café para a pessoa sem oferecer mais nada. 

Várias vezes já entramos na casa de australianos tendo que pular por cima das coisas esparramadas, principalmente quando pegamos eles de supetão. Tem cachorros dentro de casa em cima dos sofas, roupas espalhadas pelo chão, guarda-roupas abertos e camas desfeitas. Se a casa é assim, imagina a garagem que para eles não é lugar de carro e sim de tralhas. A gararem é o local onde jogam tudo o que foi substituído, estando velho ou não. Elas ficam tão abarrotadas que obviamente não cabem mais os carros. Ontem meu marido deu carona para o chefe dele que exclamou, "mas que carro limpo", só para dar um exemplo.

Teia de aranha nos espelhos dos carros é normal
Sinceramente, não sei como o povo vive desse jeito nesse país, eu, com minha mania de limpeza e organização, como diz meu marido. É costume entrar na cozinha e bater-se com as pias todas cheias de pratos e panelas pra lavar. Se você se atrever a abrir a máquina de lavar pratos, prepare-se para saltarem morcegos, gatos e cachorros. Teias de aranha nem se fala, elas estão até nos espelhos externos dos carros com os donos dirigindo na rua. Matagal? Acostume-se pois é bom pra se esconder das visitas inesperadas.

Quando fazem festas, eles reservam um único lugar para aquilo. Você muitas vezes entra pelo portão lateral e vai direto para a pergola no quintal onde estão todos instalados, churrasqueira principalmente. Você mal entra em casa, a não ser quando precisa ir ao toalete, e é nessa hora que você “vê” o estilo de vida deles, caso eles tenham esquecido alguma porta aberta. 

Pérgola no quintal. Pode ser muito bonito e parecer agradável,
mas o problema são os costumes...
Toalete é uma pequena caixinha que só cabe você. Se você abrir as asas, bate nas paredes. Para abrir a porta é preciso recuar e quase cair sentado de novo no toalete. Dalí você sai e entra na porta contígua que é a do banheiro. Lá tem pia, chuveiro, e geralmente uma banheira.

Quer dizer, tudo o que você fizer no toalete, vai impregnar duas maçanetas. Depois de lavar suas mãos, certamente você não vai sair limpando as maçanetas por onde passou. Quem vai limpar são as mãos do próximo ocupante do toalete. Agora imagine a situação das mulheres em seus períodos...

Panelas sujas o dia inteiro
São tantos os exemplos de falta de higiene que, quando alguém se atreve a dizer que fica feliz de voltar de viagem na Europa quando chega em casa na Austrália porque “é tudo tão limpo”, dá vontade de esfregar a cara da pessoa nas calçadas pra elas comerem os chicletes pretos infalíveis.

Estacionamento de shoppings e prédios, jamais são  lavados, varridos ou dedetizados. A sujeira é evidente nos lugares mais sofisticados, mas parece que ninguém enxerga, só eu. Até meu marido consegue enxergar.

Café

Agora prestem atencão nesta reportagem da revista GoodWeekend do jornal The Sydney Morning Herald de 6 de dezembro de 2014 sobre a cultura do café na Austrália.

Recebendo em casa
Comecei falando sobre as diferenças de costumes me referindo a que quase nunca me dou bem quando convido alguém para visitar-me na minha casa, louca para oferecer cafezinho e bolinhos como todos estamos acostumados no Brasil, num ambiente aconchegante, descontraído, em que podemos conversar sem hora para terminar. 

Mas que nada, isso nunca dá certo, com algumas raríssimas excessões. O costume daqui é marcar encontro num café.

O Sideways Deli Cafe, um dos que vivem sempre lotados. Pessoas
costumam fazer fila do lado de fora, esperando mesa. Por trás
desta fachada tombada tem um grande apartamento moderno.
Ora, a gente tem café tão facilmente no Brasil e em toda parte dele que nem sequer presta atenção no que significa um café conforme o povo conhece por aqui, ir a um café por ai já passa a ser mais por luxo, um encontro casual. No Brasil, os cafés funcionam também no estilo lanchonetes em que você vai para passar um tempo conversando enquanto experimenta algum bolinho ou salgadinho com um café sofisticado ou até mesmo um milk shake de café.

Mas aqui a cultura dos cafés é muito mais do que isso. Primeiro parece que vira religião. Certas pessoas passam a ser freguesas do mesmo café até surgir outro mais moderno na região, porque fidelidade não é exatamente uma virtude do australiano. Ele parece mais com prostituta, sai com aquele que dá mais sem nem olhar pra trás.

Sideways Deli Cafe, no inner-west de Sydney (Oeste central) que 
ganhou prêmio de melhor café, como se pode ver na faixa
vermelha, numa hora de pouco movimento
Então, se você quer conversar com alguém, tem que marcar um café num café.

O grande problema dos cafés para mim não são propriamente os preços exorbitantes por bolinhos aguados e bate-entopes, é que você tem hora marcada para conversar. Enquanto seu café durar, você pode continuar conversando, mas daqui a pouco, ou você se empanturra mais de café e gasta mais, ou você só vai continuar sua conversa na próxima semana, caso haja outro convite para outro café, senão, nunca mais.


Tentando enxergar por baixo da superfície...
Ora, o que é uma conversa de meia hora de café? Nada. É conversa superficial. Mas não tem nada que agrade mais o australiano do que uma conversa superficial, simplesmente porque eles são todos superficiais. O pouco que eles avançam o sinal, logo retornam, se recolhem, e desaparecem por um tempo. Quando lhe reencontram, convidam para um café de novo, começando assim: como é mesmo o seu nome?

Para vocês não dizerem que sou uma mentirosa insatisfeita e invejosa, veja o que escreveu esta repórter a seguir, a qual não é brasileira.

Três regras de cafés que todos nós devemos concordar

Lisa Pryor


Le petit dejeuner (breakfast ou caf'é da manhã) com café e croissant
numa mesa de um café em Paris. Sinceramente, não troco pela
minha casa ou a casa de uma amiga. Foto de Katharine Andriotis.
Querem saber? Café não é escritório, e um café de quatro dólares não paga o aluguél de uma mesa durante seis horas. Tenha um pouco de empatia para com os proprietários das pequenas empresas cuja subsistência está sendo afetada por você ao demorar-se demais numa mesa deles nos horários de pico.

Quando se trata de cafés, certas regras são impostas. A indústria dos cafés tem estado quase completamente de acordo com a moda de que cada reforma num café deve agora incluir tijolinhos expostos, madeira bruta, telhas de metrô e toques em preto e branco.

Cachorro em café próximo à torre Galata em Istambul, Turquia
Porém, há as coisas em que não se está de acordo quando se trata de negócios relacionados a passa tempos regados a cafeína. Crianças. Será que elas deviam existir? Laptops. Quanto tempo você pode justificar utilizando o WiFi após ter encomendado um único café flat white? Cães. Sob a mesa ou amarrados num poste de luz, com focinheiras ou latindo? O café tornou-se um campo de batalha de costumes, moral e paternidade.

Como uma das piores clientes de café do mundo, estou realmente em posição de falar sobre este assunto. Ou eu apareço cheia de crianças pequenas pra ficar muito tempo, ou chego com um laptop e permaneço além da conta.

Mas existem algumas regras de café as quais proponho e acho que todos poderíamos concordar:
Laptop ao ar livre no Brasil? Não pensem que aqui é comum
também não

  1. Você não pode se queixar do tempo que leva para conseguir uma mesa quando você foi quem escolheu ir a um café no fim de semana depois que ele ganhou um prêmio e quando há uma dúzia de outros cafés a dois minutos a pé, que estão metade vazios, com os proprietários chorando sobre seus leites derramados, ou melhor, seus cafés ligeiramente torrados esperando por clientes.
  2. Quanto aos laptops, livros e romances, você pode ficar lendo e escrevendo enquanto tiver um centímetro de café em sua xícara, ou mais importante ainda, até quando a xícara estiver cheia novamente. Mas uma vez que o local esteja cheio, você está ocupando um lugar que pode ser tomado por um cliente que vai realmente comprar alguma coisa. Até então você estará fazendo um favor ao negócio, fazendo-o não parecer completamente impopular.
  3. Pare de reclamar que os cafés são barulhentos. Cafés são um ponto de encontro onde a comunidade se reúne para ficar chateada com as outras pessoas e meter o cacete nelas. Reclamar dos outros clientes, julgar seus vestuários, suas maneiras de criar, seus animais de estimação e suas barbas não é o que estraga um café, mas o que é bom do café, de modo que você deve aproveitar também.
Conversa num café em Provença, Itália
Então é isso, né? Esse povo tão bem comportadinho baixa o sarrafo nos outros com a cara mais lisa do mundo, em que você olha para eles e lhes parece que todos são tão amáveis, simpáticos, tolerantes e agradáveis, quando por dentro eles estão fervendo, enquanto seus olhares entre si, se batessem no seu com mesma intensidade, lhe fulminariam alí mesmo.

Pois bem, agora eu sou chique e sou convidada para tomar café num café de vez em quando. Mas, sinceramente, eu preferiria ficar muito mais à vontade na casa de cada uma ao invés de submeter-me às críticas de quem não tem o que fazer na vida. 

Ah, então é assim, a alma do café é justamente arrasar com os outros? Nisso eu sou mestra, minha filha, vamos lá.


Fila para o primeiro café gato (Cat Cafe) em Nova Iorque
No artigo ainda faltaram outros aspectos com relação a cafés aqui na Austrália.

Primeiro, muita gente só toma café da manhã em cafés. Então elas reservam uma hora para isso, a fim de comerem bolinhos sem graça com enormes cafés em potes chamados "mugs", que são canecas. Elas enfrentam filas por causa disso e não se cansam. Aqui ninguém conhece nosso famoso cafezinho preto, o que muito estrangeiro elogia por ser a forma mais esperta de tomar café no mundo. Aqui você tem que passar meia hora só escolhendo o tipo de café que você está a fim de tomar daquela vez, coisa que todo mundo deve adorar, ou então pede sempre a mesma coisa, geralmente com leite, o que é uma refeição em si.

7 pacotinhos de açúcar
Segundo, meu marido me conta que, de vez em quando, suas reuniões da empresa são num café no andar térreo do prédio em frente. Quando Deus dá bom tempo, as pessoas se reúnem numa mesa ao ar livre para conduzirem a reunião, geralmente em caráter menos formal e mais amigável, uma espécie de descontração. Você chega e dirige-se ao balcão onde escolhe o café e/ou o bolinho, paga, e vai esperar na mesa. Um garçom ou garçonete metidinho a besta virá com o seu café e seu bolinho quando estiverem prontos. Meu marido não gosta de café amargo, então ele coloca açúcar, aí pega 7 pacotinhos que são equivalentes a colheres de chá no caneco de café dele. As pessoas ficam olhando hipnotizadas para sua operação rasga-saquinho, despeja açuquinha, mexe, mexe, mexe até o danado se dissolver, isso 7 vezes num ritual, até que, quando ele termina, o café está frio. Por isso ele odeia cafés, já não chega pagar mico por encher a mão de saquinhos, levando a metade disponível na loja inteira de uma vez só.

Ah sim, os cafés nunca valem à pena. E como sei disso? Ora, conheço os cafés brasileiros ao ponto de identificar os lugares que os importam na Austrália para finalmente poder saborear o que é um café de verdade, sob o ponto de vista de um dos maiores produtores de cafés do mundo, o Brasil. 

Quer apavorar o povo daqui? Diga que você cresceu no Brasil tomando café de manhã e de noite na casa dos seus pais desde que era criança. Quer que eles lhe julguem um esbanjador e perdulário, diga que toma banho duas vezes por dia. Quer que eles lhe julguem pernóstico e metido a superior, mostre a sua casa arrumadinha. Você não é "normal" para os padrões australianos...